terça-feira, 6 de dezembro de 2011

mail Fernando

Obrigado, Paulo, por me repassar o texto da Anginha.

Que lindo texto.

Eu começo sem saber o que dizer, você sintetizou o não-sintetizável, a enorme latitude de pensamento, ação e coração que foi o Murilo:
Era um ser bio-geo-zoo-arquio-histo-poli-meteo-socio-lingui-astro-artista-editor-arqui-enge-intele-velejador-remador-construtor- jardineiro-criador...
Eu dizia, até dia 13/10/2011, que eu não conhecia essa dor, eu não tinha perdido alguém próximo, pois meus pais ainda estão aí.
Eu perdi meu melhor amigo. Não sabia que doía tanto. Não para de doer. Não paro de chorar.
É um buraco tão enorme.
Eu sei que não é isso que se deve escrever, nessa hora, a gente tem que buscar algo positivo em algum lugar, mas eu não encontrei ainda.
Só percebo a perda.
Quando penso que vou visitar a Paula amanhã, penso que vou entrar naquela casa, tudo turva.
É uma atitude egoísta, imagino, mas a dor é pelo que perdi, a possibilidade de continuar a conviver com uma pessoa tão especial.
Não conheço ninguém que chegue perto do que me foi o Murilo.
É uma mistura de admiração pelo realizador que ele era, com um pedaço de orgulho: “e tudo indica que esse cara gosta de mim.”
Era uma coisa infantil, aquela coisa de querer contar orgulhosamente pros outros: “eu sou amigo dele”.
É como se eu pudesse dizer que fui amigo do Leonardo da Vinci. E não sei se o Leonardo era tão legal quanto o Murilo.
Ter sido amigo do Murilo é uma das coisas mais importantes que aconteceram na minha vida.
Nossa viagem para pescar peixes de pedra no Araripe, nossa viagem para Tiradentes, nossas idas para Visconde de Mauá, que maravilha foi viajar com ele. Que inveja eu senti dos que puderam acompanhá-lo nas viagens mais recentes. É que nas viagens esse caráter polímata dele exuberava.
Mas como disse a Anginha, também no cotidiano era um esplendor: qualquer visita à casa de Murilo e Paula era a certeza de ter um momento brilhante. Parece exagero, mas não é.
Ele só me fez uma sacanagem na vida: ir embora tão cedo. Isso eu não tou aceitando.
Na sexta feira eu senti vontade de participar de alguma coisa musical para partilhar com ele, com a memória dele.
Precisaria ser uma percussão muito basal, primal.
Bem, é preciso buscar um jeito de dar a volta por cima: é considerar a minha sorte de tê-lo conhecido.
É, preciso agradecer ao Viola por organizar as festas em que eu e ele, deslocados no meio dos dançarinos, nos encontramos.
Que puta sorte. Disse Anginha: Estar ao seu lado me fez ser uma pessoa melhor.
E então, como homenageá-lo?
O desafio que ele me deixa é tentar “imitá-lo”, ainda que dentro das minhas limitações.
Ser mais amplo, como ele. Em cada coisa que eu fizer que vá além do que eu acho que sei fazer, haverá uma homenagem a ele.
É meio religioso isso, mas não terá sido assim que começaram as religiões? Com a vontade de homenagear alguém especial, que nem Buda ou Jesus devem ter sido?
Tudo bem, não vamos fundar o Murilismo, ele iria achar ridículo ( O Murilo achava alguma coisa “ridícula”? parece-me que não...), mas confesso que ele me deixou ensinamentos. E não foram poucos. Com aquelas frases de efeito, muitas vezes havia enormes verdades.
Lembro-me da última. Ele disse algo como “na academia, só os autoritários publicam”. Não foi bem isso, mas havia um conceito de que muitos de nós, acadêmicos, deixamos nossas incertezas justificarem nossa preguiça. Já os autoritários, os donos da verdade, esses não tem esse tipo de problema. Portanto, vençamos a preguiça!
Ou então a frase que, nascida num tombo qualquer do Martim, vejo verdadeira em tantas ocasiões: “O que dói é a vergonha”.
Ou então a frase que nunca entendi “O barroco é a constatação”.
Ufa, com essas batatadas, que ele se deliciaria em contrariar, eu quase consigo parar de chorar.
Amigos, que saudade eu já sinto.
Fernando
PS.: demorei 2h e cinco idas ao lavabo escrever esse email.

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